Um novo relatório dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) aponta que a prevalência do autismo continua a crescer no país. Os novos números mostram que uma a cada 31 crianças entre 4 e 8 anos de idade estão no espectro autista. A tendência de aumento se apresenta nas demais edições do levantamento: em 2020, a taxa era de uma a cada 36 crianças, enquanto em 2018 era de uma para 44. Considerado uma das fontes mais relevantes sobre o diagnóstico de autismo na infância, o estudo do CDC é referência tanto nos Estados Unidos quanto em outros países.
O Brasil tem 2,4 milhões de pessoas diagnosticadas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), o que representa 1,2% da população, conforme as informações do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre os diversos dados revelados pelo levantamento, o Censo também aponta que 3,8% dos meninos entre 5 e 9 anos (264 mil) e 1,3% das meninas na mesma faixa etária (86 mil) têm diagnóstico de TEA. Os diagnósticos mais concentrados estão entre crianças de 5 a 9 anos (2,6%), seguidos de 0 a 4 anos (2,1%), o que reforça o avanço no diagnóstico precoce, resultado de maior conscientização e busca de informações por parte de pais e responsáveis.
Em Cotia, desde 2020 as pessoas diagnosticadas com TEA recebem a CIPTEA, também conhecida como “carteirinha do autista”, que lhes permite a identificação para atendimento prioritário nos serviços públicos e privados. De agosto da 2020, quando foi lançado este programa até o final de 2024, de acordo com dados da Secretaria de Desenvolvimento Social de Cotia, foram emitidas 1298 CIPTEA. Só em 2024 foram 355 e em 2025, até o final de maio, 96 novas carteirinhas emitidas, o que dá um total de 1394 pessoas identificadas com TEA no município. Desde 25 de fevereiro de 2025 o cadastro é feito pela Secretaria da Mulher, Neurodiversidade e Inclusão Social de Cotia. Segundo a Secretária Solange Aroeira, a carteirinha também pode ser solicitada via Portal Gov.br, porém a Secreraria não tem o a essas emissões, portanto, o número de pessoas identificadas pode ser ainda maior, sem contar as que não solicitaram a CIPTEA.
De acordo com a Secretária Solange Aroeira, nos primeiros cinco meses da nova Secretaria, também já foram realizadas algumas ações inéditas na cidade para esta população:
Audiência Pública dos Jovens Autistas – Em uma ação inédita no município, a Secretaria, em parceria com o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, realizou pela primeira vez a Audiência Pública dos Jovens Autistas, na Câmara Municipal de Cotia. O evento teve como objetivo dar voz aos jovens autistas, que puderam relatar suas experiências, dificuldades e barreiras enfrentadas no município. Durante a audiência, também foi realizada a palestra “O Poder Transformador da Maternidade Atípica: Crescendo com os Desafios”, voltada a sensibilizar o público e fortalecer a rede de apoio às famílias.
Evento “Autismo e Comunicação” – Atividade que discutiu a comunicação alternativa e os recursos que facilitam a expressão de pessoas com autismo e outras condições que dificultam a fala, ampliando o entendimento sobre ibilidade comunicacional.
Microfone Aberto “Essência e Voz” – Realizado na praça, o evento foi um espaço para expressão livre de pessoas com deficiência e neurodivergentes, que puderam compartilhar suas vivências, talentos e visões. A iniciativa promoveu visibilidade, escuta ativa e protagonismo.
Graus de autismo ou níveis de e?
Durante o processo de diagnóstico de autismo vivido por muitas famílias, é comum surgir o momento em que se investiga — ou confirma — que um dos membros está no espectro do autismo, com diferentes níveis de intensidade. Embora o termo “grau” de autismo ainda seja amplamente utilizado para se referir a essas variações (leve, moderado ou severo), ele serve apenas como uma simplificação. A forma mais precisa, segundo os manuais clínicos, é falar em níveis de e necessários para cada pessoa.
Com o ar dos anos, importantes publicações como o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), da Associação Americana de Psiquiatria, e a CID (Classificação Internacional de Doenças), da OMS, aram por diversas atualizações — inclusive na forma de classificar e nomear os critérios diagnósticos para o autismo. Atualmente, o diagnóstico é definido com base no nível de e que o indivíduo necessita no dia a dia.
“Para diagnosticar uma pessoa com qualquer distúrbio ou transtorno, precisamos ter certos critérios estabelecidos. Para que a gente precisa de um critério diagnóstico? Por muitos aspectos, a comunicação entre as diferentes áreas é o primeiro deles. Então, quando eu falo para uma fonoaudióloga que eu tenho um paciente autista, ela vai ter a mesma definição do autismo que eu, que sou psicóloga, ou do médico, do psiquiatra, e assim em diante”, explica Lívia Bomfim (CRP 06/133549), Psicóloga e Gerente de Produto da Genial Care, rede de cuidado de saúde atípica especializada em crianças autistas e suas famílias.
O que significam os níveis de e no autismo?
“Terminologias como “autista leve, autista moderado e autista severo”, embora hoje tenham caído em desuso e sejam questionadas e criticadas por muitos especialistas em TEA e ativistas da causa do autismo, ainda acabam sendo bastante usados”, ressalta Lívia Eles podem ser descritos da seguinte forma:
Nível 1 (autismo leve): a pessoa neste nível apresenta dificuldades sutis, mas que impactam a vida cotidiana, especialmente em situações sociais. Pode ter dificuldade em iniciar ou manter interações, demonstrar rigidez em comportamentos ou interesses e apresentar certa resistência a mudanças. Com apoio adequado, consegue maior autonomia e a linguagem funcional geralmente é preservada.
Nível 2 (autismo moderado): indivíduos neste nível têm desafios mais evidentes na comunicação verbal e não verbal, além de padrões comportamentais repetitivos mais intensos. A interação social pode ser limitada ou atípica, mesmo com e. As dificuldades são mais perceptíveis e exigem intervenções mais estruturadas. No critério diagnóstico, podem apresentar deficiência intelectual e linguagem funcional prejudicada.
Nível 3 (autismo severo): os desafios são mais significativos. A pessoa pode ter limitações graves na comunicação e nas interações sociais, além de comportamentos repetitivos intensos que interferem na rotina. Além disso, podem apresentar deficiência intelectual e ausência da linguagem funcional.
A definição em “níveis de autismo” é adequada?
Segundo a psicóloga da Genial Care, parte da comunidade do autismo e de pessoas autistas considera que a atual classificação por níveis não representa adequadamente a condição. Para esses grupos, esse modelo é visto como ultraado e impreciso, já que não contempla a complexidade e a diversidade das vivências no espectro.
“O termo pode carregar conotações que atualmente e, felizmente, têm sido criticadas, como conotações capacitistas. Então, tem toda uma frente de ativismo dentro do mundo do autismo para quebrar essa noção de que um é “melhor” do que o outro, de que um é mais funcional do que o outro”, comenta Lívia.
Como explica a especialista, uma pessoa no espectro pode precisar de e em aspectos da comunicação, mas não apresentar dificuldades comportamentais. Por outro lado, outra pessoa pode se comunicar com facilidade, mas manifestar comportamentos repetitivos e interesses s. “Dizer que uma pessoa é nível um, dois ou três é muito inflexível dentro das tantas variações que o autismo pode acarretar. Além da questão do capacitismo, na qual o grau um é considerado o mais ‘funcional’, no grau dois, a pessoa já é menos funcional e grau três, ela não é nem um pouco funcional e é um problema”.
Atualmente, especialistas não enxergam o diagnóstico de autismo como uma limitação, mas sim como parte da diversidade do desenvolvimento humano. Por isso, independentemente do nível de e necessário, é fundamental que as famílias vejam as pessoas autistas como indivíduos com potencial e múltiplas possibilidades.
O investimento em terapias baseadas em evidências científicas é essencial para apoiar o desenvolvimento das crianças, independentemente do diagnóstico. Além disso, a participação ativa dos pais e a estimulação em casa são fatores decisivos para ampliar os resultados das intervenções.
“Pessoas com autismo são seres humanos variados e fluidos. O que elas precisam de tipos de es diferentes dentro das diferentes habilidades que ela executam. Essa noção enrijecida e determinista de que ou é um e outro é outro, é incorreta. É uma noção importante para os pais desenvolverem”, conclui a psicóloga e Gerente de Produto da Genial Care.
Documentário retrata o autismo pelo olhar sensível de famílias brasileiras
“Fora da Caixa” já está disponível no canal da Luna ABA no YouTube
O documentário Fora da Caixa, idealizado e roteirizado pela produtora executiva Marcélia Aguiar Ferreira e dirigido por Gabriel Ferreira, já está disponível no canal Luna ABA, no YouTube. O filme apresenta um olhar sensível e profundo sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) por meio das experiências de diferentes famílias brasileiras que convivem com o autismo.
Além de retratar os desafios e as complexidades do dia a dia, a obra tem como objetivo desconstruir estereótipos e despertar empatia no público sobre a natureza humana, a delicadeza e a sinestesia que permeiam a realidade dos autistas.
Por meio de entrevistas com os especialistas e pesquisadores Lucelmo Lacerda e Thiago Castro, o documentário também apresenta estratégias e práticas baseadas em estudos científicos para reduzir comportamentos desafiadores e promover o desenvolvimento de habilidades.
Mais que discutir diagnósticos e tratamentos, Fora da Caixa reforça a importância do acolhimento, do respeito e da inclusão, destacando a urgência do tema nas políticas públicas e na saúde do país.